RECRIA E TERMINAÇÃO DE CORDEIROS EM CONFINAMENTO: REVISÃO
SÁ,J.L. e OTTO DE SÁ,C.
1. INTRODUÇÃO
Os sistemas de criação de ovinos no Brasil e no mundo são extremamente variáveis. É possível encontrar animais confinados em um sistema intensivo, até animais criados extensivamente, muitas vezes, quase em estado selvagem. Não há um sistema padrão que possa funcionar adequadamente em todas as regiões, pois as condições climáticas, taxas de lotação, área disponível para a criação e disponibilidade e qualidade das forragens são muito diferentes.
Em determinados Estados do Brasil, como por exemplo, São Paulo e Paraná, certas características podem propiciar a utilização de técnicas mais avançadas de criação, como por exemplo, o confinamento de cordeiros. Estas regiões apresentam áreas pequenas para a criação dos animais, os rebanhos não são tão numerosos como no sul do país, a lotação é elevada e a terra é bastante valorizada. Nestas condições, a produtividade por hectare deve ser alta para que a atividade seja economicamente viável. Os cordeiros devem apresentar elevadas taxas de crescimento e atingirem peso de abate ainda jovens. Quando os cordeiros são terminados exclusivamente à pasto, nem sempre o ganho de peso é bom, principalmente quando o desmame dos animais coincide com épocas onde a disponibilidade e a qualidade das pastagens são inadequadas para atender a exigência nutricional destes animais.
Na fase de lactação, as ovelhas são bastante sensíveis à verminose. Há uma alta eliminação de ovos de parasitas nas pastagens neste período, contaminando os cordeiros. Se a lotação das pastagens é alta também, os cordeiros podem apresentar uma diminuição no ganho de peso e em casos mais graves podem vir até a morrer. É possível observar esta diminuição na taxa de crescimento do cordeiro já aos 45 dias de idade. Uma solução para esta situação seria o desmame precoce e o confinamento dos cordeiros.
Nestes últimos anos o criador tem recebido em função do peso do animal produzido, entretanto, tem se discutido muito sobre a qualidade da carne ovina. O sistema de produção de cordeiros afeta em muito as características de carcaça. A idade que o animal atinge o peso de abate, sexo, e principalmente a alimentação utilizada na fase de recria e engorda dos cordeiros, são fatores importantes a serem considerados para melhorar a qualidade final do produto. As dietas baseadas em pastagens são mais baratas, entretanto, as taxas de crescimento são menores, e o animal vai para o abate com uma idade avançada. Já no confinamento, as dietas são mais caras, porém, o ganho de peso e a conversão alimentar são melhores. Mas, se os cordeiros engordados no confinamento forem castrados, ou se as dietas forem muito ricas em concentrados, ou então, se o peso estipulado para o abate for muito elevado, poderá ocorrer uma alta deposição de gordura na carcaça dos animais, o que não é desejável.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
PASTAGENS NA TERMINAÇÃO DE CORDEIROS
As pastagens representam a forma mais prática e econômica de alimentação dos ovinos. Pode-se dizer que no mundo, a maioria dos cordeiros que chegam ao mercado, nunca receberam suplementação através de concentrados. Em áreas onde se pratica a agricultura intensiva, tais como regiões da Nova Zelândia, Austrália, Inglaterra e outras áreas da Europa, Estados Unidos e alguns lugares da América do Sul, a forragem de boa qualidade é a base principal para a produção de cordeiros (CHURCH, 1984). Entretanto, a ótima utilização de pastagens por ovinos é difícil de se conseguir (NRC, 1985). As forrageiras não crescem uniformemente e a estacionalidade não permite uma produção constante de forragem durante o ano (EUCLIDES, 1994). Além do mais, forrageiras em estádio de crescimento avançado, apresentam baixos níveis de proteína e altos teores de fibra, fazendo com que ocorra um declínio da digestibilidade e do consumo pelo animal. A combinação de parasitas internos e a incapacidade de cordeiros jovens consumir matéria seca adequadamente, resultam em ganhos de peso nas pastagens 40 a 60% menores do que os obtidos em confinamento (JORDAN & MARTEN, 1968). Dependendo da época de terminação dos cordeiros e do tipo de pasto utilizado, a taxa de crescimento dos cordeiros pode ser muito baixa (HOPKINS et al., 1995a ; HOPKINS et al., 1995b ).
2.2. CONTROLE DA VERMINOSE ATRAVÉS DO CONFINAMENTO
Na criação de ovinos, uma das maiores barreiras enfrentadas é a verminose. Esta patologia representa grandes perdas econômicas no rebanho. Segundo PINHEIRO (1988), o controle da verminose tem relação direta com o aumento no número de ventres e, conseqüentemente, com a produção de cordeiros.
O terço final da gestação é um dos períodos em que o animal necessita de altos níveis de nutrientes, pois é o momento destinado ao crescimento fetal. Desta forma, a alimentação canaliza-se prioritariamente ao cordeiro, e a ovelha torna-se mais sensível a verminose. O estresse provocado pelo parto também contribui para o aumento na postura de ovos de parasitas (COSTA et al., 1986). Este mesmo fato ocorre com as fêmeas lactantes. A imunossupressão durante o período periparto, dos quais os hormônios glicocorticóides, adrenocorticóides e a prolactina são citados como causadores da supressão da reatividade dos linfócitos, é responsável pelo fenômeno "periparto" que consiste em um aumento na quantidade de ovos de nematódeos gastrintestinais eliminados nas fezes, por ovelhas em final de gestação ou lactação (GIBBS & BARGER, 1986; AMARANTE et al., 1992). Já os cordeiros no pós desmame, a interrupção da lactação leva a uma condição de estresse, tornando estes animais também mais sensíveis a verminose e, se houver como agravante um manejo sanitário inadequado, culminará no aumento da mortalidade. Desta forma cria-se um ciclo que produz um rápido aumento no grau de infestação dos animais e dos campos, sendo maior o problema quando o cordeiro permanece por um período prolongado de tempo com a mãe, estabelecendo-se uma competição entre mães e filhos pelos pastos e concentrados disponíveis, sendo que, a própria ovelha contamina com ovos de parasitas as pastagens que servem de alimento para os cordeiros (PINHEIRO, 1988).
No trabalho realizado por SIQUEIRA et al. (1993), cordeiros confinados apresentaram ganho de peso médio diário (0,153 Kg) superior aos animais mantidos em pastagem de "coast cross" (0,088 Kg), apesar da disponibilidade de matéria seca no pasto estar acima das necessidades dos animais. O grupo de animais que permaneceu na pastagem apresentou altas infecções por Haemonchus contortus e Trichostrongylus e a taxa de mortalidade de cordeiros mantidos à pasto foi alta (16,23%) quando comparada com a do confinamento (0%). Baseado nestes resultados é que se recomenda fazer a recria de cordeiros em confinamento, principalmente em propriedades que não possuem pastagens descontaminadas para colocar os cordeiros desmamados.
ANIMAIS PARA O CONFINAMENTO
O ganho de peso no confinamento é normalmente mais caro do que na terminação à pasto (NOTTER et al., 1991b; MURPHY et al., 1994). Por isso a escolha de animais que apresentam potencial para ganho de peso é importante. Alguns dos fatores relacionados com o animal, que afetam o desempenho no confinamento estão descritos a seguir:
A) Peso ao Nascer dos Cordeiros - cordeiros que nasceram com pesos baixos em função da má nutrição das ovelhas durante a gestação (principalmente no terço final), mesmo que receberem uma boa alimentação após o nascimento dificilmente recuperam o peso até o abate. Segundo a revisão realizada por BELL (1984), cordeiros que nasceram com 10% a menos de peso, permaneceram até o desmame com 9% de peso inferior ao dos cordeiros, filhos de ovelhas adequadamente nutridas na gestação. Este menor peso persistiu até 18 semanas após o desmame, o que significa prejuízo para os sistemas de terminação que abatem cordeiros com 4 a 6 meses de idade.
B) Idade - a idade que o cordeiro apresenta quando inicia a engorda em confinamento vai afetar principalmente a conversão alimentar. A medida que o animal se torna mais velho aumenta a deposição de gordura na carcaça e diminui a deposição de água e proteína, sendo que esta mudança é mais evidente na fêmea. Consequentemente, a conversão alimentar piora com a idade do animal, em virtude do custo energético para depositar gordura na carcaça, ser maior (CHURCH, 1984).
C) Sexo - o ganho de peso, a conversão alimentar e as características de carcaça de animais confinados, podem variar em função do sexo. Os animais inteiros apresentam um desenvolvimento mais rápido do que os capões e as fêmeas (LLOYD et al., 1981; DRANSFIELD et al., 1990). Este crescimento mais rápido está em função da menor deposição de gordura na carcaça, sendo que este menor teor de gordura é uma característica buscada pelos atuais sistemas de terminação de cordeiros (LEE et al., 1990). Entretanto, alguns produtores tem relutado em trabalhar com cordeiros machos inteiros (ARNOLD & MEYER, 1988). Segundo DRANSFIELD et al. (1990), a carne de animais inteiros abatidos com um peso elevado, é mais seca do que a dos animais castrados, porém, se os cordeiros forem abatidos jovens, esta depreciação na qualidade da carne não é observada. No trabalho realizado por NOTTER et al. (1991b), cordeiros machos inteiros confinados depois do desmame, apresentaram um ganho de peso do nascimento até o abate de 368 g/dia, superior ao dos cordeiros castrados e das fêmeas que foi de 350 g/dia e 335 g/dia, respectivamente. De acordo com LEE et al. (1990), cordeiros machos inteiros e cordeiros fêmeas deveriam ser manejados separadamente. Por causa da forte relação entre peso de carcaça, gordura e a tendência de fêmeas apresentarem mais gordura a um determinado peso, elas devem ser enviadas para o abate a um peso inferior ao estipulado para os machos.
ALIMENTAÇÃO NO CONFINAMENTO
A influência da nutrição na produção de carne é evidente. A alimentação de cordeiros recém desmamados e em fase de terminação pode ser em confinamento ou em pastagens. Em confinamento, aumentando a proteína e a energia na alimentação, eleva-se o ganho médio diário e melhora-se a conversão alimentar. Os níveis de proteína na carcaça aumentam linearmente com o aumento de proteína na dieta, enquanto a composição de extrato etéreo diminui. O nível elevado de energia na dieta tende a aumentar a deposição de gordura na carcaça. Portanto, a composição do ganho pode ser alterada de acordo com o regime alimentar no confinamento (ELY et al., 1979). Sistemas de alimentação que promovem um rápido crescimento do cordeiro, como por exemplo, o fornecimento de concentrados através do confinamento, usualmente resultam em uma melhor eficiência alimentar. Entretanto, o consumo excessivo de concentrados resulta em cordeiros mais gordos do que aqueles que consomem forragens (McCLURE et al., 1994).
Boas pastagens podem produzir carcaças ovinas de elevada qualidade, com a mesma eficiência da alimentação em confinamento (ELY et al., 1979). Entretanto, o ganho médio diário obtido através do pasto pode variar bastante em função da espécie e do manejo da forragem. Por exemplo, o ganho conseguido através de pastagens leguminosas é superior ao obtido com gramíneas (McCLURE et al., 1994), embora o consumo de leguminosas pode causar sabor desagradável na carne (NOTTER et al., 1991c). Animais destinados para o abate, que são alimentados com dietas baseadas em forragens por um determinado período de tempo, desenvolvem o tecido esquelético e o muscular sem excesso de gordura (MURPHY et al., 1994). Segundo NOTTER et al. (1991b), carcaças de cordeiros produzidas em pastagens podem se tornar mais atrativas em função da menor deposição de gordura.
Em vários trabalhos que comparam o desempenho de animais em confinamento e em pastagem, observa-se um maior ganho de peso para animais confinados (NOTTER et al., 1991b; McCLURE et al., 1994; MURPHY et al., 1994 e McCLURE et al., 1995). Entretanto, nestes mesmos trabalhos o teor de gordura na carcaça para animais terminados em confinamento é mais elevado. O problema é que em muitos destes estudos o peso de abate dos animais foi muito elevado. MURPHY et al.(1994), abateram os animais com 48 Kg além de utilizar cordeiros castrados, o que aumenta muito a deposição de gordura. NOTTER et al. (1991b) abateram os machos com 55 Kg e as fêmeas com 50 Kg. ELY et al. (1979) observaram que cordeiros abatidos com 40,8 Kg foram mais eficientes em conversão alimentar do que cordeiros abatidos com 49,9 Kg. Nos Estados Unidos o peso de abate preferido para cordeiros é de 45 Kg (CHURCH, 1984), o que é muito alto para os padrões do consumidor brasileiro.
Na exploração de carne ovina, a categoria de cordeiros destinados à engorda é uma das que apresentam as maiores exigências protéicas. Nesta categoria, alguns aminoácidos tais como metionina, lisina, cistina, arginina e histidina (VEIRA et al., 1985), tornam-se limitantes para o máximo ganho de peso, uma vez que a quantidade disponível para esse tipo de animal é inferior às suas exigências, mesmo quando é fornecida elevada quantidade de concentrados, sem que estes concentrados possuam uma fonte de proteína de alta qualidade e baixa degradabilidade ruminal em sua composição (KLOPFENSTEIN, 1985). Por isso, algumas dietas de confinamento possuem em sua composição alguma fonte de proteína protegida para elevar os ganhos de peso. No confinamento realizado por BONA et al. (1994), cordeiros machos que receberam níveis de 6,6% de farinha de peixe (baixa degradação ruminal) no concentrado, tiveram um ganho de peso 22,25% superior ao dos animais que receberam concentrado, cuja fonte proteica era exclusivamente o farelo de soja, de alta degradação ruminal.
2.5. AVALIAÇÃO ECONÔMICA DA TERMINAÇÃO DE CORDEIROS
Diferentes sistemas de produção de cordeiros podem produzir diferentes taxas de crescimento, mas este ganho de peso não pode ser equiparado diretamente com a lucratividade dos sistemas. Os sistemas que promovem rápido crescimento dos cordeiros, usualmente alcançam maior eficiência alimentar, e requerem poucos dias para os cordeiros atingirem peso de mercado, mas também exigem o uso de uma alimentação mais cara. Sistemas de produção baseados em forragens, usualmente estão associados com ganho de peso mais baixos, mas o custo total do ganho deve ser menor do que os de sistemas de produção mais intensivos. Atualmente, além do peso do animal, as características de carcaça vão influenciar no retorno econômico do sistema utilizado. Historicamente, os preços de cordeiros estão em função do peso vivo, mas há uma grande preocupação em não produzir somente em quantidade mas também com qualidade. Portanto, a qualidade da carcaça do cordeiro poderá futuramente afetar a avaliação econômica dos sistemas de recria e terminação dos cordeiros (NOTTER et al., 1991a).
No estudo realizado por MACEDO (1998), os cordeiros confinados apresentaram maior retorno econômico (+R$269,13), tendo produzido 212,76 Kg de carcaça a mais do que os de pastagem. OTTO et al. (1998) tiveram um custo com alimentação superior para os animais terminados em confinamento, entretanto, 1 hectare de pasto de azevém engordou 30 cordeiros enquanto 1 hectare de milho produziu silagem para engordar 290 cordeiros em confinamento. Portanto, o lucro e a produção de carne por hectare foi superior para os cordeiros terminados em confinamento em relação aos terminados em pastagem.
CONCLUSÕES
Com base na revisão bibliográfica realizada, pode-se tirar algumas conclusões:
A implantação da recria e engorda de cordeiros em confinamento, depende de uma avaliação cuidadosa da propriedade que se está trabalhando, da sua localização e características ambientais, da taxa de lotação, tipo de pastagens disponíveis, época de terminação dos cordeiros e característica do animal a ser confinado.
O confinamento é recomendado quando a disponibilidade de pastagens de qualidade para os cordeiros é baixa. Também, em regiões onde as condições ambientais propiciam uma elevada contaminação dos pastos por parasitas, juntamente com elevadas taxas de lotação, o desmame precoce e a recria e engorda de cordeiros em confinamento, são técnicas de manejo que controlam as perdas causadas pelos vermes, sem necessitar do uso abusivo de vermífugos.
Em regiões onde o valor da terra é elevado, a produção de carne por hectare deve ser maximizada, o que só é conseguido com técnicas intensivas de produção.
O animal a ser confinado deve ser jovem e apresentar potencial de ganho de peso elevado. Se a alimentação utilizada nos confinamentos é de qualidade e, provavelmente, de alto custo, espera-se que o cordeiro responda a esta melhor nutrição com taxas de crescimento elevadas e ótima eficiência alimentar.
Cordeiros machos que são abatidos ainda jovens não necessitam ser castrados. A castração aumenta a deposição de gordura na carcaça além de piorar a eficiência alimentar.
Fêmeas devem ser abatidas com peso inferior ao dos machos, por depositarem mais gordura na carcaça e serem menos eficientes no ganho de peso.
Excesso de concentrado na dieta do confinamento, e abate de animais muito pesados, produz carcaças com altos teores de gordura.
A decisão da implantação do confinamento, depende principalmente, do maior retorno econômico, que este sistema intensivo de terminação de cordeiros, pode propiciar.
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